sábado, 20 de outubro de 2007

HIPOCRISIA

A sociedade é naturalmente hipócrita. Não entendo porque lutamos tanto pela inclusão social se pequenas diferenças, sejam elas de pensamento ou até mesmo de insegurança, já nos fazem temer o pior. Não entendo porque luto tanto pela inclusão social se meu maior desejo é encontrar alguém com quem eu me identifique, que seja em algum momento semelhante a mim.

Eu sou naturalmente hipócrita porque, num dos meus mais rasos argumentos, não consigo amar o que não entendo. Eu sou naturalmente hipócrita porque escondo não só dos outros, mas também de mim os meus verdadeiros anseios, escondo de mim os meus desejos e os ofusco com o brilho eterno de uma mente sem lembranças ruins, ou que prefere não cultivá-las.

Quero muito acreditar que dias melhores não demoram a chegar, que na verdade estão mais perto do que imagino. Quero muito continuar escrevendo sobre as coisas boas da vida, mas ao mesmo tempo que sorrio me culpo, pois sei que existe alguém que chora. E isso me dói, porque às vezes eu esqueço de mim e trabalho para que as pessoas que eu mais amo sejam felizes. Eu ultrapasso minhas crenças e escuto, mesmo que a felicidade delas não chegue nem perto de me ser um benefício. E então me calo.

Eu canto e idolatro os poemas de Renato Russo, pois seu tom de voz me é surreal. Contudo, tenho plena consciência dos erros que ele cometeu. Eu transcrevo versos de Cazuza, pois a bandeira que um dia foi dele hoje é também uma das minhas, mesmo sabendo de toda a sua história. Não me adianta afirmar que todos os poetas foram boêmios, depressivos e rebeldes, pois eu não consigo ser assim e sou poeta. Portanto, hipócrita.

A hipocrisia é um mal que tentamos ao máximo evitar, mas é intrínseco e faz parte. Uma verdade pode vir a contestar outra e tudo, no fim das contas, é contraditório mesmo sendo belo. Tudo, no fim das contas, é desigual e atinge as pessoas. Fere. Machuca. Deixa cicatriz. Enquanto faz gozar a outras. Enquanto uns sentam a mesa, outros não têm pão para comer. E então o que mais se pode fazer?

Luto pelo pensamento sistêmico, mas divido a minha vida em capítulos, separo meus grupos de amigos. Quero o desenvolvimento sustentável, mesmo sabendo que a contra-maré é imensamente maior do que eu. Tsunami.

Enquanto isso se vive em meio a contrastes cada vez mais nítidos, cada vez mais tocantes. O que era obscuro e proibido passou a ser normal. Vamos celebrar o que é normal? Mas o que é assim tão normal a ponto de ser celebrado? Quem é o verdadeiro cidadão modelo? Quem foi que disse que ele existe?

Nossa sociedade, embora não exista além da sua forma abstrata, cultiva pensamentos que ninguém que eu conheça afirma ter. A própria sociedade se deturpa, se culpa, mas não faz nada para mudar. E eu já não quero mais ter de me virar em argumentos para buscar a explicação desse todo que, incondicionalmente, ninguém consegue explicar, porém não há quem não entenda porque tem de ser assim.

2 comentários:

Anônimo disse...

Basicamente sou contra a sustentabilidade, de fato não precisamos continuar a fazer as mesmas coisas só que de forma 'ecologicamente-correta', nós precisamos é abandonar esse modo de vida consumista e homogênio que está inserido na nossa mente e cultura desde que nascemos e reproduzismos até morrer. Existem idéias que funcionam como GENES, e isso me preocupa bastante. A sustentabilidade é uma forma do capital se manter por mais tempo - sair da crise em que se encontra - e de uma forma que as pessoas aceitem com bons olhos.

Gostei do teu texto e da sinceridade que vc expões as tuas angústias.

abraço,
Contine escrevendo amiga.

Unknown disse...

Bruninha, todos nós somos hipócritas em algum momento das nossas vidas. O segredo para isso não se tornar regra é tentar ser verdadeiro na maior parte do tempo possível. Mas sabemos que perfeito, só Jesus!
Beijos eum ótimo domingo!