sábado, 22 de dezembro de 2007

Escolheremos, pois, o Amor


Mensagens de Natal são sempre singelas, sempre lindas e repletas de lugares comuns. Escrever sobre Natal e Ano Novo é chover no molhado, ou simplesmente cansar mais um pouco quem já ouviu falar sobre o espírito natalino o dia inteiro no centro da cidade.


Neste natal desejo apenas que o amor prevaleça; que não esqueçamos que somos seres humanos; que um abraço vale sim mais que um presente; que deve-se alimentar bem o corpo e a alma; que devemos lembrar de quem está longe e manifestar cuidado por quem se aproxima.


E, se Shakespeare me permite, um de seus sonetos para inspirar e respirar melhor de 2008 em diante...


Que eu não veja empecilhos na sincera

União de duas almas. Não amor

É o que encontrando alterações se altera

Ou diminui se o atinge o desamor.

Oh, não! amor é ponto assaz constante

Que ileso os bravos temporais defronta.

É a estrela guia do baixel errante,

De brilho certo, mas valor sem conta.

O Amor não é jogral do Tempo, embora

Em seu declínio os lábios nos entorte.

O Amor não muda com o dia e a hora,

Mas persevera ao limiar da Morte.

E, se se prova que num erro estou,

Nunca fiz versos nem jamais se amou.


William Shakespeare

domingo, 16 de dezembro de 2007

Poetisas

Hoje eu queria criar uma poesia, mas daí saiu uma crônica. Vida de poetisa frustrada é essa: deságua tudo em dissertação e que viva o pensamento contínuo, sem mistério, mas que guarda segredos muito bem guardados nas entrelinhas. A caneta prende a respiração. As horas esperam ansiosas por uma revolução. Dias e dias de silêncio me fazem querer gritar, mas poetisa não grita, poetisa rima. Eu nunca fiz poema de rima, até tentei, mas não saiu dentro dos meus padrões, então resolvi jogar tudo p’ro alto e ver no que dava. Deu em nada. O silêncio continuou e a madrugada acabou.
Eu sempre quis escrever uma prosa, um romance, um soneto, um épico e um didático e vou continuar querendo até o dia em que eu resolver começar, até quando a poetisa frustrada que existe dentro de mim tornar suas utopias fatos.
Sorrio, porque a música me leva agora, não sei p’ra onde, mas eu estou indo. Parece o Cazuza dizendo: vida louca, vida breve. Já que eu não posso te levar, quero que você me leve! Som ritmado, concebido numa hora que ele jamais pôde recordar. Acho que o meu maior erro é manter-me bem de corpo, é não machucá-lo com algo que faria bem p’ra minha mente. Mas me condeno, porque a minha maior tortura está no sofrer do pensamento. Posso chegar à exaustão do salto alto às cinco horas da manhã, mas minhas idéias discorrem sobre o passado até que os olhos se fechem e digam fim p’ra toda a bagunça que eu arrumei.
Sim, eu sou desarrumada mesmo. Eu não tenho a boca da Angelina e o 1,20m de perna da Ana, mas eu sei pensar, e como sei! Chegar a uma boa decisão é o que tem de mais difícil. Talvez seja por isso que a poesia não me conduza e a boa e velha crônica me desperte a amizade das horas incertas toda vez que eu preciso ficar acordada e, assim, sonhar um pouco com as coisas que ainda vão acontecer...

domingo, 9 de dezembro de 2007

19*

Perdi 10 em 19 amizades
Por conta de uma pedra em minhas mãos
Embriaguei morrendo 19 vezes
Estou aprendendo a viver sem você
Já que você não me quer mais

Passei 19 meses num navio
E 19 dias na prisão
E aos 19 com o retorno de saturno
Decidi começar a viver
Quando você deixou de me amar
Aprendi a perdoar e a pedir perdão

E 19 anjos nos saudaram
E tive 19 amigos outra vez...


*Releitura da obra de Renato Russo... "Vinte e Nove", quando ele escrevia para a Legião.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Duas vezes Porto Alegre


Porto Alegre ainda está muito viva dentro de mim. As lembranças recentes e a folha pautada em branco me atormentam. É uma eterna tempestade que se instala agora, um furor contínuo que me desperta e descansa. Contraste.
Contraste foi a minha primeira impressão da capital há exatos dois meses, quando voltei da minha primeira viagem. Um contraste estranhamente harmônico é claro, mas algo que me transcendeu o pensamento.
Prefiro evitar comparações entre a primeira viagem e esta que tentarei retratar por agora, mesmo que eu sinta não ter conseguido escrever sobre ela durante a viagem de volta. Porém, sei que certamente a segunda impressão haverá de chegar um dia.
Resumir é difícil. Fazer resenha é pior ainda. Narrar tornaria a história um tanto factível, todavia sem a devida análise de símbolo. Vou simplesmente contar o que guardei.

A gente gosta de pessoas, a gente gosta dos nossos bens materiais, a gente gosta de conversar. Eu gosto de conhecer, de viajar. Eu gosto de analisar Porto Alegre, a cidade que pelos contrastes gritantes me cativou o pensamento. Eu tinha vários motivos para voltar ainda este ano, só não havia dinheiro para tal investimento. Às vezes o acaso é meu amigo e, então, dessa vez ele me levou a Porto Alegre para participar do VIII Seminário Internacional sobre Agroecologia e IX Seminário Estadual sobre Agroecologia, a convite da Emater Regional. Era a perfeição que se concretizava: meu tema de estudo, meu empenho e meu lugar.
Saímos de Erechim por volta das duas horas do dia 19 de novembro último. Eu e mais quatro colegas da faculdade de Tecnologia em Meio Ambiente acompanhamos um grupo de funcionários da Emater. Fomos recolhendo gente pelo caminho, Getúlio, Coxilha e Passo Fundo e o ônibus foi lotando. Ouvi Renato Russo quase que por toda a viagem, além da gaita e violão do grupinho animado da frente do ônibus – note-se, não estavam no fundo e sim nas primeiras poltronas!
Chegamos em Porto ao pôr do Sol no Guaíba. Via-se os rasgos vermelhos no horizonte do rio. Beirava às nove horas quando desembarcamos em frente ao Mosteiro de Capuchinhos, que nos acolheria como filhos pelos próximos três dias. Minhas colegas e eu estávamos exaustas, mas ainda jantamos antes de descobrir que havia sala de internet e quartos maravilhosos no lugar, além dos móveis de época e pátios enormes.

Acordamos às sete horas da manhã do dia seguinte, não absolutamente prontas para tudo que o dia nos traria, mas preparadas para a maratona de palestras no Teatro Dante Barone da Assembléia Legislativa de Porto Alegre.
Eu vi o céu azul de Porto Alegre. Eu via as casinhas simples, os monumentos das avenidas, os prédios de arquitetura moderna dividindo o espaço das ruas estreitas com “os das antigas”. Eu via diversidade de gente.
Era calor, mas o teatro tinha ar condicionado e luz baixa. O sono bateu na solenidade de abertura do evento. Tudo bem, a palestra inicial foi interessante, do ponto de vista de que não se deve ficar em cima do muro perante as questões ambientais, mesmo que as atitudes gerem polêmica.
Demorava-se cerca de trinta minutos de viagem entre a Assembléia e o mosteiro, mas ainda assim fazíamos quatro vezes por dia este trajeto. Achei dispendioso ambientalmente (mais carbono na atmosfera), mas vantajoso economicamente (sobrou dinheiro, pois não precisamos pagar para comer). E então, você escolheria qual alternativa? Mesmo que não acreditem, eu ficaria com a opção de almoçar lá por perto mesmo, mas se o fizesse, o faria sozinha.
Muito bem. Voltamos ao teatro atrasados por causa do almoço no mosteiro. A primeira meia palestra foi excelente. Não ficamos na segunda porque a palestrante era da Espanha e só ablava spañol. Não conseguimos compreendê-la e resolvemos sair mais cedo e passear um pouco.

Recordo “Duas vezes Porto Alegre” porque além de ser meu segundo texto sobre a cidade, senti que o deveria escrever em duas etapas. Logo na volta e agora, pois a gente sempre tem dúvidas...Se se deve continuar pelo mesmo caminho a passos largos ou parar, descansar, refletir e ensaiar uma nova continuidade. Eu escolhi pensar um pouco. Assim como nos dias em que estive em Porto pela segunda vez, eu escolhi pensar em meio a correria para ter certeza dos meus objetivos.

Naquela meia tarde que tínhamos antes de voltar ao mosteiro, atravessamos o shopping Rua da Praia e entramos na Rua da Praia p’ra ver o que havia de bom e barato por lá que Erechim não possuía. Cavouquei as lojas em busca do meu vestidinho roxo e não o encontrei. Optei então por acompanhar minhas colegas na aventura pelo consumismo contido delas, mas acabei não comprando nada. Perto das cinco, voltamos ao teatro Dante Barone, na Assembléia, para ouvir a última palestra, mas acabamos nos aboletando na praça do Três Poderes para esperar o pessoal da Emater e voltar ao mosteiro dos capuchinhos.
Mais meia hora de viagem e acabei por ouvir que os melhores perfumes ou as “melhores essências” estão nos menores frascos. Algumas respostas são inevitáveis na nossa vida, mas para cada escolha que fizemos devemos renunciar a outras.
Descrever o restante da viagem seria difícil em meio a imensidão de acontecimentos, mas transformar metáfora em eufemismo é extremamente simples quando aprendemos com nossas ações e descobrimos coisas sobre nós que nem imaginamos que fossem possíveis de existir dentro da gente.

Na quarta-feira eu também assisti palestras. Comprei um colar roxo, já que o meu vestido não existia; admirei as paisagens como se quisesse tirar fotos de cada uma delas; tirei fotos inesquecíveis e fiz parte da vida das minhas colegas como se fossemos irmãs. Dizem que os amigos são a família que nos permitiram escolher. Dizem, também, que os amores vêm e vão, como tardes de verão. Muitas pessoas são difíceis de serem retratadas justamente porque ficam de maneira única no coração da gente, mesmo que nunca mais voltemos a vê-las. No mosteiro teve festa na terça e na quarta de noite; tinha violão, gaita e quase 50 vozes embalando o fundo das conversas jovens no jardim da frente do mosteiro. Teve até internet que me serviu para quase nada. E eu só consegui sonhar de olhos abertos...

Na quinta-feira o clima era de alívio e tristeza. Estávamos voltando para casa, mas poderíamos ficar ali a vida toda que eu não me importaria. A gente não foi p’ra shopping e nem saiu p’ra balada. Assistimos a uma palestra inteira em spañol sobre a Pegada Ecológica e não dormimos! Demos risada até perder o fôlego e mandarem a gente ficar quieto. Estávamos mesmo a fim de fazer algo pelo mundo depois daqueles dias, e não desistimos! Embarcamos às dezessete horas rumo a Erechim. E se pode comparar essa volta com praticamente uma vida inteira. Teve sono, sonho, risada, festa, notícias ruins, notícias boas, humanidade, apoio, conversa, silêncio, jantar, ironias, piadas, histórias de vida, planos para o seminário do ano que vem, harmonia e esperança. Praticamente tudo que é fundamental para se viver consciente e com a alegria de saber acreditar no futuro, o no futuro melhor para todos que passarem pelo mesmo caminho que agora percorremos.